AOS AMIGOS CATÓLICOS
AOS AMIGOS CATÓLICOS
Todos estamos tristes com o que consideramos o pior efeito do distanciamento social: a suspensão das Missas presenciais. Sentimos falta do augustíssimo sacramento. Lamentamos a impossibilidade de encontrar pessoalmente com o Senhor, verdadeiramente presente na hóstia e no vinho consagrados. Participar das santas missas à distância pode até ser alguma coisa, mas não é tudo.
Meu objetivo aqui, porém, não é ficar despejando lamentações. Nem discutir se cabe ou não ao Estado suspender Missas. Muito menos questionar se haveria outra forma de conciliar a prevenção orientada pelas autoridades médicas e o exercício da fé. A essa altura todo mundo tem sua opinião formada, boa ou ruim, certa ou errada.
Meu objetivo é simples. Peço um pouco mais de compreensão, carinho e respeito ao nosso clero. A Igreja é uma hierarquia, não uma democracia, graças a Deus.
Vejo muita gente acusar o clero de omissão em relação ao comando estatal de fechamento de igrejas e suspensão de atividades, incluindo as santas Missas.
Se fosse gente sem fé, gente má, aventureira ou oportunista, eu nem perderia tempo escrevendo. Eu me limitaria a rezar. Ou, se a misericórdia me fugisse do coração, a praguejar. Confesso-o sem muito constrangimento.
Preocupa-me ver enxurradas de críticas vindas de gente boa, de fé, que ajuda a Igreja a se manter fiel no depósito da Verdadeira Fé e na missão maior que o próprio Senhor lhe confiou: salvar almas.
Mas o que poderiam fazer os Bispos e Padres? Enfrentar o Estado e colocar os fiéis em risco?
Vi comparações um tanto despropositadas. Comparou-se, por exemplo, a atual situação, que é mundial, à perseguição criminosa que o governo mexicano dirigiu aos católicos no início do século passado.
Lá naquele tempo não se estava diante de uma pandemia, de uma doença de fácil contágio. Via-se do Estado o vil desejo de sufocar a Igreja.
Fosse esta a situação, eu não pensaria duas vezes em defender a fé. O desafio às autoridades seria a resposta justa ao abuso. O desafio seria a defesa da garantia fundamental da liberdade religiosa. Mas não é o caso.
Hoje o fechamento provisório das igrejas e a suspensão das Missas se deram por questões bem claras de saúde pública. Se foi a melhor opção, o tempo dirá.
As autoridades não me parecem ter agido por ódio à fé, mas por receio de explosão de contágios. Por enquanto, parte significativa da comunidade científica ampara essas posições. Se acertaram ou erraram, insisto, o tempo dirá. Se exageraram na dose, insisto novamente, o futuro, talvez não muito distante, os julgará. O objetivo não é neste momento tratar do assunto.
Agindo diferente, o clero não testemunharia a fé, amiga da razão. Criaria apenas uma zona de atritos, fornecendo aos inimigos da Igreja argumentos para atacá-la, falaciosos que sejam. Obscurantista seria a palavra mais frequente na boca dos que não a suportam.
Mas foi o próprio Senhor quem ensinou aos apóstolos o ter a mansidão das pombas e a astúcia das serpentes.
A Igreja agiu estrategicamente, sem dar razão, no meu entender, a que fosse encarado como contratestemunho na fé. Existem momentos de enfrentamento; existem os de resiliência. Estou seguro de que a circunstância pede resiliência.
Não são poucos os inimigos da Igreja no mundo. E isso nada tem a ver com teoria conspiratória. É um fato. Das teorias conspiratórias, aliás, fujo como o demônio da cruz.
De qualquer forma digo em boa-fé: não enxergo na crise atual um propósito deliberado em diminuir a Igreja. Não enxergo mesmo.
Muito provavelmente, sob as cortinas da saúde popular, muita gente sentiu algum prazer com o fechamento de igrejas (e de templos, sinagogas, mesquitas, terreiros, centros etc.). Contudo, não quero crer que essa tenha sido a intenção da maioria dos agentes políticos.
Política é uma ciência complexa: quase nunca as coisas são como parecem. Não poucos vibraram com o momento presente, a começar pelo próprio demônio.
Muitos encararam a pandemia não com a altivez e a responsabilidade que se espera das autoridades públicas, mas certamente com a ganância própria daqueles que, mesmo na desgraça geral, enxergam o lucro político. Alguém duvida que muitos dos benévolos protagonistas da cena atual anteciparam o ano de 2022 para 2020?
Na mesma linha, não consigo enxergar nisso tudo um precedente perigoso, ou os passos iniciais para uma iminente supressão da liberdade religiosa.
Tudo tem seu peso, sua medida e seu valor. E qualquer outra situação, quero crer que seria imediatamente repudiada por todos os católicos, a começar pelo clero.
Ao longo dos seus mais de dois mil anos de existência, o clero deu ao mundo milhares de mártires, santos canonizados, santos anônimos, homens corajosos e compromissados com a Verdade.
Dirá algum cético, com venenosa alegria: deu também homens indignos e criminosos. Pode ser, mas em número infinitamente menor do que as outras legiões humanas. De todo modo o que seria Judas Iscariotes senão a prefiguração do mal já no centro daqueles que a dedo o Senhor escolheu?
Precisamos ser mais compreensíveis com as circunstâncias e confiantes na hierarquia da Igreja. Cada um de nós, antes de apontar sem justa razão o dedo para algum sacerdote, deve perguntar a si mesmo: sou um católico minimamente decente, coerente com a fé e com o dever de buscar a santidade?
Em vez de lhes atirar todas as críticas de que somos capazes, por que não orar por eles? Sobrou tempo? Ore pelos que perderam emprego, pelos que viram seu negócio derreter e, sobretudo, pelas vítimas fatais em todo o mundo, por suas almas e pelo consolo de seus familiares. E com a benção de Deus atravessemos este momento tão estranho, tendo em memória as palavras de santa Teresa D’Ávila: “tudo passa, só Deus fica”.
Paulo Henrique Cremoneze
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