PRINCÍPIO ACTIO NATA
SEGURADOR SUB-ROGADO EM JUÍZO E O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O DIREITO DE REGRESSO NASCE COM A SUB-ROGAÇÃO: NADA PODE ENFRAQUECER SUA FORÇA E AMPLITUDE
Direito é dar a cada um o que é seu
Código Justiniano
No dia 26 de outubro, em voto da Ministra Nancy Andrighi, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o prazo prescricional para o ressarcimento da seguradora sub- rogada começa a contar do pagamento da indenização de seguro:
“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO REGRESSIVA DE COBRANÇA. RESSARCIMENTO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA PAGA EM RAZÃO DE FURTO DE CARGA. SUB-ROGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DO PAGAMENTO AO SEGURADO. RREXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. 1. Ação ajuizada em 18/03/2014. Recursos especiais interpostos em 06 e 09/07/2018 e conclusos ao Gabinete em 09/10/2019. 2. Os propósitos recursais consistem em dizer acerca: (i) da prescrição da pretensão de ressarcimento da seguradora que indenizou o segurado por dano causado por terceiro; (ii) da responsabilidade do operador portuário pelo furto da carga importada e, (iii) do pagamento da franquia em favor da seguradora denunciada à lide. 3. Nos contratos de seguro de dano, o segurador, ao pagar a indenização decorrente do sinistro, sub-roga-se nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o causador do dano, consoante a literal disposição do art. 786, caput, do CC/02. 4. Nessa linha de intelecção, a jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que, efetuado o pagamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, pode a seguradora, por força da sub-rogação operada, buscar o ressarcimento do que despendeu, dentro do prazo prescricional aplicável à relação originária e nos mesmos limites que assistiam ao segurado. Precedentes. 5. Isso não implica, contudo, que esteja a seguradora sujeita ao prazo prescricional já deflagrado em face do segurado. Com efeito, em observância ao princípio da actio nata, o prazo prescricional para o exercício da pretensão de regresso somente pode ser iniciado quando surja para a seguradora pretensão exercitável, o que apenas ocorre na data em que efetuado o pagamento da indenização ao segurado. 6. Não obstante a oposição de embargos de declaração, a ausência de decisão do acórdão recorrido acerca dos argumentos invocados pelas recorrentes, em especial quanto à ausência de responsabilidade do operador portuário e quanto ao desconto da franquia contratual, impede o conhecimento do recurso. Aplicação da Súmula 211/STJ. 7. Ademais, eventual acolhimento da irresignação recursal, a fim de afastar a responsabilidade do operador portuário, apenas seria possível mediante a investigação da dinâmica dos fatos conforme as provas dos autos, procedimento esse que, todavia, é vedado na estreita via do recurso especial pela Súmula 7/STJ. 8. Recursos especiais conhecidos em parte e, nessa extensão, não providos.” (STJ, REsp 1842120/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/10/2020, DJe 26/10/2020, g. n.)
Decisão que espelhou outra, menos recente, da lavra do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, no AgInt no AREsp 982.198/SP:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. COMPRA E ENDA. AÇÃO DE COBRANÇA. RESCISÃO DO NEGÓCIO. TRATATIVAS EXTRAJUDICIAIS. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. DEVOLUÇÃO DE VALORES. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA No 7/STJ. TEORIA DA ACTIO NATA.
1. A reforma do julgado que entendeu pela suspensão do prazo prescricional para devolução do valor em função de tratativas extrajudiciais documentadas demandaria o reexame do contexto fático-probatório, procedimento vedado na estreita via do recurso especial, a teor da Súmula no 7/STJ.
2. Por aplicação da teoria da actio nata, o lapso do prazo prescricional somente começa com a ciência da efetiva lesão do direito tutelado, inexistindo, ainda, qualquer condição que impeça o exercício do direito de ação. Precedentes.
3. Agravo interno não provido.”
Essas decisões autorizam dizer que o Superior Tribunal de Justiça consagrou a tese de que o direito de regresso do segurador nasce com o pagamento da indenização de seguro, a sub- rogação regida pela actio nata.
Para o segurador sub-rogado o direito não nasce com o evento danoso, o sinistro, mas com o ato que lhe transfere direitos e ações do segurado (art. 786 do Código Civil: Paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano.
Direito que existia antes mesmo do atual Código Civil e que foi muito bem tratado pelo Supremo Tribunal Federal no enunciado de Súmula 188: O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até o limite previsto no contrato de seguro.
Muito nos agrada ver a tese agasalhada, já que somos defensores seus de longa data. Com a solução da questão pecuniária, por assim dizer, é que se tem por nascido o direito: solutione pecuniae ius nascitur.
Tanto confiamos no entendimento do Superior Tribunal de Justiça que no passado escrevemos o seguinte:
Abrimos aspas
Importante orientação jurisprudencial para o mercado segurador começa a ganhar fôlego no cenário do Direito brasileiro.
Primeiro a doutrina, depois a jurisprudência, duas fontes mediatas do Direito, interagindo diretamente com a fonte imediata a fim de resolver de forma justa e adequada importantes questões concretas.
Trata-se do entendimento de o termo inicial de a contagem do prazo prescricional iniciar-se na data do efetivo pagamento da indenização de seguro.
Para os defensores desse entendimento, a justificativa reside no princípio da ACTIO NATA, segundo o qual o direito de ação surge no exato momento da titularidade do direito material e este, para a seguradora, nasce com o pagamento da indenização de seguro, não com o ato-fato jurídico ocorrido com o segurado e que motivou o mesmo pagamento.
Grosso modo, referido entendimento se apoia na ideia de o direito nascer para a seguradora no exato momento em que ela se torna a efetiva titular da pretensão respectiva.
E a pretensão, propriamente dita, surge com o pagamento da indenização de seguro, isto é, com a sub-rogação de direitos e ações.
Até o pagamento da indenização, o segurado é o titular da pretensão contra o causador do prejuízo, mas, com o pagamento, a transferência de titularidade é imediata.
Daí, aliás, a importância do recibo de pagamento de indenização como prova instrumental da sub-rogação e da consequente titularidade.
Tendo-se em conta esse contexto, amplamente conhecido daqueles que operam o Direito do Seguro, é de fato muito consistente o entendimento, pois a seguradora não pode exercer a pretensão sem a devida titularidade, nascida com o pagamento da indenização.
Assim, ao invés da data do sinistro e/ou da data do efetivo conhecimento dos danos e dos prejuízos, as corriqueiramente aplicáveis para os termos iniciais de contagens dos prazos prescricionais, a data do efetivo pagamento da indenização de seguro se revela opção interessante, juridicamente defensável e até mesmo com razão ontológica para existir.
A repetição de decisões em tal sentido para a solução de arguição de prescrição chamou a atenção da equipe de advogados do escritório e passou a ser mais um componente na arena dos conflitos aparentes de normas, muito comuns nos casos envolvendo seguros de transportes de cargas.
Motivados pelas decisões conquistadas em casos por nós trabalhados, levamos adiante pesquisa mais atenciosa a respeito e descobrimos que os julgados em tal sentido, monocráticos e colegiados, são mais comuns do que o inicialmente esperado, constituindo respeitável corrente jurisprudencial.
Abaixo, breves exemplos do que se comenta:
Ementa: Transporte aéreo – Extravio de Carga – Inaplicável no caso concreto o Código de Defesa do Consumidor – Aplicação do Código Brasileiro da Aeronáutica; Partes legítimas para integrarem os pólos, ativo e passivo, da ação; Prescrição – Bienal – Não ocorrência – Inteligência do artigo três17 do CBA e da exegese da Súmula 151 do STF quanto ao início do prazo prescricional para a seguradora – Inicio desse prazo da data do pagamento da indenização pela seguradora autora; Rés responsáveis solidariamente pelo alegado extravio da mercadoria; Direito de regresso – Sujeição à prova do sinistro indenizado – Pagamento operado que não obsta a apreciação da prova do dano – Subrogação de direito que não modifica a necessária comprovação do mesmo; Extravio da mercadoria – Ausência de prova da sua ocorrência – Vistoria inconclusiva – Ação improcedente – Sentença reformada – Recursos providos. (TJSP – Apelação 918três122-19.2007.8.26.0000; 20a Câmara de Direito Privado; Relator Desembargador Cunha Garcia; Data do julgamento: 02/0três/2009)
Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL – Ação Regressiva – Prescrição da ação que não se verificou – Aplicação do artigo 206, parágrafo trêso, inciso V, do Código Civil vigente – Termo inicial a partir do ressarcimento – Contrato de transporte de mercadorias – Obrigação assumida pela ré em transportar mercadoria e entregá-la em seu destino – Obrigação que somente poderia ser afastada se comprovado caso fortuito ou força maior – Ônus da prova que incumbia à ré (art. trêstrêstrês, inciso II, do CPC) – Hipótese, ademais, que a prova produzida demonstrou que, ao contrário, a transportadora não cumpriu com diligência seu ofício – Inteligência do art. 749, NCCivil – Sentença mantida – Recurso improvido, com observações. (TJSP – Apelação 9228080-56.2008.8.26.0000; 14a Câmara de Direito Privado; Relatora Desembargadora Lígia Araújo Bisogni; Data do julgamento: três0/0três/2011)
Ementa: Prescrição – Ação de indenização – Contrato de seguro de transporte de mercadoria – Ocorrência de roubo de carga – Pagamento de sinistro à segurada pela seguradora – Ajuizamento da demanda por esta sub-rogada nos direitos e ações daquela – Protesto interruptivo da prescrição apresentado – Não ocorrência de citação válida neste – Marco inicial do prazo prescricional correspondente à data do pagamento do sinistro – Prazo prescrícional de dois anos já alcançado – Reconhecimento da prescrição mantida – Recurso improvido. (TJSP – Apelação com Revisão 9117070-75.2006.8.26.0000; 21a Câmara de Direito Privado; Relator Desembargador Antonio Marson; Data do julgamento: 28/0três/2007)
Ementa: Acidente de veículo – Regressiva – Litisconsorcio necessário com a seguradora da ré – Questão decidida em decisão saneadora, irrecorrida – Preclusão – Prescrição do pedido de regresso – Inocorrência – Termo inicial da contagem que corresponde à data do pagamento da indenização pela seguradora ao segurado – Triênio não transcorrido – Improvimento. (TJSP – Apelação 92três1187-45.2007.8.26.0000; 26a Câmara de Direito Privado; Relator Desembargador Vianna Cotrim; Data do julgamento: 27/10/2010)
Ementa: Seguro – Responsabilidade Civil – Regressiva de cobrança -Acordo celebrado pela autora segurada – Desembolso e postulação de ressarcimento da Seguradora ré – Alegação de falta de anuência da seguradora aos acordos – Falta que implicaria descumprimento a condição prevista na apólice – Falta de cobertura securitária para indenização por danos morais. Sentença de improcedência Recurso parcialmente provido. 1. Pronuncia-se a prescrição em relação à cobrança regressiva do valor de R$ 11.200,25, pago em 17/12/200três, mais de dois anos antes do ajuizamento da ação regressiva, superado pois o prazo prescricional da ação regressiva. 2. Não há prescrição a reconhecer, no alusivo ao valor de R$ 200.000,00, pago em agosto, setembro, outubro e novembro de 2005, ajuizada que foi a ação em 0três/4/2006 (CC, 206, par. Io., II, “a”). três. O termo inicial da prescrição, em casos como o presente, corresponde as datas em que pagas as indenizações objeto do pedido regressivo. 4. É puramente potestativa e, pois, inválida, a cláusula que subordina a eficácia de acordo entre o segurado e terceiro, lesado, à prévia e expressa anuência da seguradora. 5. Não pode a seguradora recusar-se ao reembolso sob fundamento de que não ter sido notificada da demanda anterior, se não traz um único e convincente elemento indicativo de que, tivesse havido sua convocação, o resultado da demanda anterior seria diverso. 6. Se a apólice de seguro cobre qualquer modalidade de “danos pessoais” ou “danos corporais”, sem expressa, clara e destacada advertência de que não abrange os danos morais, estes não podem ser excluídos, em face do princípio da boa-fé objetiva. Danos morais inscrevem-se entre os danos pessoais. (TJSP – Apelação 00758três4-três4.2008.8.26.0000; 29a Câmara de Direito Privado; Relator Desembargador Reinaldo Caldas; Data do julgamento: 15/09/2010)
Convém esclarecer que não se trata de posicionamento definitivo e uniforme.
Apenas de uma corrente jurisprudencial, cada mais forte e que merece especial atenção.
Esse posicionamento vem se mostrando sólido, respeitável, edificado em fundamentos robustos e enérgicos. Mas ainda não é a palavra final sobre o assunto (como se fosse possível uma palavra final no Direito).
Aliás, tão sólida é que já figura no STJ – Superior Tribunal de Justiça, fundamentada pelo princípio da ACTIO NATA, ou seja, em vernáculo, o NASCIMENTO DA AÇÃO (entenda-se, do direito à pretensão).
Sempre é bom enfatizar que, para a seguradora, o direito ao exercício da ação nasce efetivamente com o pagamento da indenização de seguro ao segurado, oportunidade em que a pretensão é transferida pela sub-rogação.
Nossa orientação, em termos práticos, é de que seguradoras continuem usando os critérios já rotulados “tradicionais”, comuns e sedimentados, até porque todo o mercado já trabalha em torno deles (seguradoras, corretores de seguros e segurados).
Diz o ditado popular que cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. Sendo possível, convém não correr riscos.
Mas, se porventura o prazo rotulado como tradicional (a data do sinistro, por exemplo) for por algum motivo ignorado, é perfeitamente possível, válido, eficiente e juridicamente aceitável a adoção deste entendimento: início da contagem do prazo prescricional para a seguradora a partir da data do pagamento da indenização de seguro, data da efetiva sub-rogação.
Há de se esclarecer que tal entendimento não desonera de forma alguma o segurado, num dado caso concreto, de velar pela acuidade da questão prescricional. Não observar o prazo das medidas que a preservam implicará eventual perda do direito à indenização (exceção pelo contrato não cumprido e ofensa à cláusula segundo a qual não pode o segurado prejudicar o direito do segurador). Ora, o fato de se poder usar uma arma de defesa, um remédio, não desqualifica o injusto civil-contratual.
Não obstante, é quase um bálsamo notar que no cenário jurisprudencial brasileiro, contaminado por visão errada do mercado segurador, alguma mudança em tal sentido se faz vislumbrar; ecos do melhor Direito e da Justiça são proclamados em prol desse mesmo mercado, e por conseguinte em prol de toda a sociedade.
Fechamos aspas
Na oportunidade em que escrevemos o ensaio, iniciamos com a seguinte afirmação, então forte expectativa: Importante orientação jurisprudencial para o mercado segurador começa a ganhar fôlego no cenário do Direito brasileiro.
Hoje, podemos dizer que a expectativa se avolumou e ganhou tônus muscular de entendimento de Corte Superior.
Todavia, os alertas que foram feitos lá atrás – e que se encontram no texto acima reproduzido – merecem ser bisadas e continuam cheios de sentido: 1) por mais que se tenham decisões fortes em favor do conceito da actio nata, do nascimento da ação de regresso com o pagamento da indenização de seguro (solutione pecuniae ius nascitur), sendo possível, devem os
seguradores sub-rogados, por excesso de cautela, ainda cuidar da data do sinistro como ideal para o início da contagem do prazo prescricional; 2) não pode o segurado descuidar do seu dever de zelar pela saúde do ressarcimento em regresso do segurador, sob pena de perder direito a indenização.
Por que dos alertas?
Sobre a prescrição em si: orientação jurisprudencial é algo poderoso, mas não definitivo. Todo o mundo sabe que os tribunais mudam de opinião, até porque o Direito é cambiário e dialético por excelência. A teoria tridimensional do Direito, elaborada pelo saudoso professor Miguel Reale, exibe bem essa natureza volátil, necessária até mesmo para a evolução social.
Sobre o dever do segurado: o fato de a jurisprudência conceder algum benefício ao segurador quanto ao exercício do seu direito contra terceiro em nada impacta, muito menos altera, os direitos e obrigações recíprocos das partes do contrato de seguro. Logo, o segurado não pode se valer de algo para deixar de cumprir outro algo, ainda mais importante e que lhe compete, sob pena de incidir na figura legal e principiológica da exceptio nom adimpleti contractus, a exceção do contrato não cumprido de que trata o art. 476 do Código Civil: Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.
Alertas à parte, o fato a destacar é que os seguradores hoje podem se valer de um ótimo benefício jurisprudencial para a melhor defesa dos seus legítimos direitos e interesses.
E que se diga desde logo: a busca do ressarcimento em regresso é, mais do que um direito, um dever do segurador, um ato de lealdade ao colégio de segurados, ao mútuo, e que se reveste de invulgar função social, de modo que a saúde do negócio de seguro interessa à sociedade como um todo.
Daí a importância de proteger o conceito de ressarcimento e de interpretações do sistema legal como a empregada pelo Superior Tribunal de Justiça.
Já não mais se discutindo o valor da tese do nascimento da ação de ressarcimento ao segurador com a sub-rogação, o que se tem a discutir é: a amplitude conceitual da decisão.
Como assim?
Explicamos: se o direito de ação de ressarcimento ao segurador nasce com a sub-rogação, é certo dizer que tudo o que precede o ato e que prejudica seu pleno e eficaz exercício não pode atingi-lo, titular que é de algo que transcende seus próprios interesses.
Em outras palavras: da mesma forma que o segurador sub-rogado não vê prescrita sua ação de regresso antes do pagamento da indenização de seguro, não se vê prejudicado por disposições outras como cláusulas de eleição de foro estrangeiro, de compromisso arbitral, de limitação de responsabilidade do causador do dano, de qualquer tipo de restrição de direitos.
Nem se trata de analisar se essas cláusulas, em contratos entre segurados e causadores dos danos, são válidas e eficazes ou abusivas e ilegais; também não se trata apenas de prestigiar – como prestigiado sempre deve ser – o poderoso parágrafo 2o do art. 786 do Código Civil (É ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em prejuízo do segurador, os direitos
a que se refere este artigo), mas de reconhecer que, se nem mesmo a lei civil (a da prescrição) atinge o segurador sub-rogado sem a necessária calibragem, sem o uso atento de princípios como o da proporcionalidade, quiçá a norma de um contrato do qual sequer foi parte.
Não se pode admitir em qualquer aspecto da vida, especialmente o Direito, o uso infeliz da máxima “um peso, duas medidas”, mas apenas de outra, valiosa e prática: “o que vale para o mais, vale para o menos”. Assim, insistimos: se a lei sofre benéfica modulagem interpretativa, deve qualquer outra norma também sofrer, premiando a proteção de um instituto que, desde seu nascimento, tem por objetivo maior o bem comum.
Mas isso já outra história, que merece estudo específico.
Por enquanto, saudemos a decisão do Superior Tribunal de Justiça que, ao tratar da prescrição, protegeu o ressarcimento em regresso e a justiça, dando a cada um o que é seu: ao mútuo, por meio do segurador, o reembolso dos prejuízos indenizados; ao causador do dano, o dever de reparação integral (art. 944 do Código Civil). Ao mundo todo: a vitaliciedade do contrato de seguro e a segurança jurídica.
Paulo Henrique Cremoneze
Advogado, é especialista em Direito do Seguro e em Contratos e Danos pela Universidade de Salamanca (Espanha), Mestre em Direito Internacional Privado pela Universidade Católica de Santos, acadêmico da Academia Brasileira de Seguros e Previdência, diretor jurídico do Clube Internacional de Seguros de Transportes, membro efetivo da AIDA – Associação Internacional de Direito de Seguro, do IASP – Instituto dos Advogados de São Paulo e da IUS CIVILE SALMANTICENSE (Universidade de Salamanca), presidente do IDT – Instituto de Direito dos Transportes, professor convidado da ENS – Escola Nacional de Seguros, associado (conselheiro) da Sociedade Visconde de São Leopoldo (entidade mantenedora da Universidade Católica de Santos), autor de livros de Direito do Seguro, Direito Marítimo e Direito dos Transportes, pós-graduado em Formação Teológica pela Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção (Ipiranga), hoje vinculada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Patrono do Tribunal Eclesiástico da Diocese de Santos. Laureado pela OAB-SANTOS pelo exercício ético e exemplar da advocacia.
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