Estudo: vida no Legislativo e possibilidade de morte no Judiciário

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Um dos argumentos utilizados no Judiciário para produzir decisões contra a vida humana é a omissão do legislativo. A Constituição Federal prevê, no §2º do art. 103 que “Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias”. Um dos motivos para o ajuizamento da ADPF 442, pelo PSOL, é o suposto descumprimento pelo Poder Legislativo, cujos deputados são representantes do povo, na forma do § único do artigo 1º da Constituição Federal, de sua obrigação de legislar a favor do homicídio intrauterino, registrado como aborto nos artigos 124 a 128 do Código Penal. Não é verdade que o Legislativo descumpre sua obrigação. O Legislativo brasileiro sempre defendeu a vida, em todos os seus aspectos e sob qualquer condição. Além dos textos constitucionais já conhecidos por todos, em especial o art. 7º. inc. XVIII. que garante “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias”, há uma profusão de leis aprovadas contra a violência e a favor da vida. Uma retrospectiva mostra que o Legislativo cumpriu seu dever. Começo pela Lei nº 7.853, de 24.10.1989, que “Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Corte, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes e dá outras providências”. Em 13.07.1990, após aprovação do Legislativo, foi publicada a Lei nº 8.069, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente, com ampla proteção às crianças e adolescentes. No mesmo ano, em 25.07.1990. outra foi promulgada, a Lei nº 8.072, sobre os crimes hediondos: “Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências”.   Em seguida, na Lei nº 8.213, de 24.07.1991, que “Dispõe sobre Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências” e estabelece a obrigatoriedade de contratação de pessoas portadoras de deficiências: Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:” Pouco tempo depois, em 24.02.1995, o Parlamento aprovou a Lei nº 8.989, que proporcionou a compra de veículos com isenção de impostos: “Dispõe sobre a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, na aquisição de automóveis para utilização de transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoas portadoras de deficiência física e dá outras providências”. Em 12.02.1996, a Lei nº 9.265, regulamentou o inciso LXXVII, do artigo 5º, da CF, para  conferir gratuidade aos atos necessários ao exercício da cidadania, art. 1º, inciso VII – o requerimento e a emissão de documento de identificação específico, ou segunda via, para pessoa com transtorno do espectro autista”.  A possibilidade de um prolongamento da vida de qualquer pessoa, também foi enfrentada pelo Legislativo, através da Lei nº 9.434, de 1997, que “Dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências”. Ainda no mesmo ano, em 10.12.1997, foi aprovada a Lei n° 9.527, que acrescentou na Lei nº 8.112, de 11.12.1990, o §3º do artigo 98, que diz: “As disposições do parágrafo anterior são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente portador de deficiência física, exigindo-se, porém, neste caso, compensação de horário na forma do inciso II do art. 44.”  Em 19.12.2000, mais uma lei para proteger as pessoas com deficiência física, a de nº10.098: “Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências”. Em 1º.10.2003, o Legislativo aprovou a Lei nº 10.741, conhecida como Estatuto do Idoso, para dar maior proteção aos direitos e à vida dos idosos. O Legislativo também aprovou a conhecida Lei Maria da Penha,  de nº 11.340, promulgada em 7.8.2006, que “Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, dispõe sobre a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal, e dá outras providências”. A Lei nº 12.662, de 5.6.2012, “Assegura validade nacional à Declaração de Nascido Vivo – DNV, regula sua expedição, altera a Lai n° 6.015, de 31 de dezembro de 1973, e dá outras providências”. A Lei nº 12.764, de 27.12.2012, “Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista; e altera o §3º do art. 98 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1.990”. Em 9.03.2015, mais uma lei, de nº 13.104, introduzindo o crime de feminicídio, para proteger a vida: “Altera o art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos”. A produção legislativa em defesa da vida é contínua. Em 6.7.2015, a Lei n° 13.146, conhecida por Estatuto da Pessoa com Deficiência, consolidou vários dispositivos já existentes e acrescentou novos, para proteger a pessoa portadora de deficiência. Nova lei, de n° 13.257, de 8.3.2016, objetivando a primeira infância, “Dispõe sobre políticas públicas para a primeira infância e altera a Lei n° 8,069, de 13.de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente, o Decreto-Lei nº 3.869, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943, a Lei n° 11.770, de 9 setembro de 2008, e a Lei n° 12.662, de 5 de junho de 2012”. Até o Executivo, regulamentando a Lei n° 9.434, de 4.2.1997, em 18.10.2017, expediu o  Decreto Presidencial nº 9.175, que proíbe a doação de órgãos pela gestante, no art. 9º,  § 7º: “A gestante não poderá doar órgãos, tecidos e partes de seu corpo, exceto medula óssea, desde que não haja risco para a sua saúde e a do embrião ou do feto”A Lei nº 13.771, de 19.12.2018, alterou o Código Penal, para proteger menores, idosos e portadores de deficiências: “Altera o art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal),  para incluir, no §7º,  qualificadoras para os crimes praticados:  “II – contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental; III – na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima”.  Em 19.12.2018, a Lei nº 13.772,  “Altera a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para reconhecer que a violação da intimidade da mulher configura violência doméstica e familiar e para criminalizar o registro não autorizado de conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado”. Um grande exemplo do empenho do Legislativo contra a violência e a favor da vida, está na Lei nº13.811, de 12.03.2019, que modificou o artigo 1.520 do Código Civil. Dizia o artigo 1.520 que “Excepcionalmente, será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil (art. 1517), para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez”. O texto facilitava a violência contra a mulher menor de idade.  O autor do estupro podia ameaçar e forçar a vítima a se casar com ele, para evitar o cumprimento de pena.  Depois do casamento, abandonava a mulher, sem ficar responsável por nada. O Legislativo corrigiu essa distorção, com a modificação do texto: Art. 1.520.  Não será permitido, em qualquer caso, o casamento de quem não atingiu a idade núbil, observado o disposto no art. 1.517 deste CódigoNa nova redação do artigo 1520, foi eliminada a possibilidade de descumprimento da pena pelo crime de estupro. O criminoso pagará pelo crime cometido, independentemente de se casar ou não com a vítima.  Em 26.04.2019, mais leis protetivas da vida: a de nº 13.819, que “Institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio”; a de n° 13.827, de 13.05.2019, que “Dispõe sobre a prática da equoterapia”, explicada no § 1º : “destinada a abordagem interdisciplinar nas áreas de saúde, educação e equitação voltada ao desenvolvimento biopsicossocial da pessoa com deficiência” e a de nº 13.836, de 04.06.2019, que “Acrescenta dispositivo ao art. 12 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, para tornar obrigatória a informação sobre a condição de pessoa com deficiência da mulher vítima de agressão doméstica ou familiar”. Mais recentemente, neste ano, foi aprovada a Lei do Autista, de nº 13.977, de 8.1.2020, que “Altera a Lei nº 12.764, de 27.12.2012 (Lei Berenice Piana, e a Lei nº 9.265, de 12.02.1996, para instituir a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), e dá outras providências”. Na CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, existem vários dispositivos modificados ou novos, dentre eles os artigos 391, 392 e seus parágrafos e incisos, 392-A, introduzidos pelas Leis:  9.799, de 26.5.1999; 10.421, de 15.4.2002; 12.812, de 16.5.2013 destinados à proteção à maternidade. É possível que várias leis não foram mencionadas neste estudo. Porém, pelo conjunto legislativo apontado, pode-se afirmar, categoricamente, que o Poder Legislativo cumpre sua obrigação de legislar a favor da vida.  Pode-se afirmar também que o Legislativo não pode autorizar a prática de crimes contra a vida, em qualquer estágio dela: no período intrauterino, no infantil, na adolescência, na fase adulta ou na velhice. Seja por motivação econômica, de cor, raça, sexo, religião ou qualquer outra, o país democrático que autorizar a morte de seus filhos nos úteros das mulheres estará aprovando a violência contra seus cidadãos antes mesmo de eles enxergarem a luz do Sol.  Exemplos de assassinatos em massa, por motivos diversos, temos muitos ao longo da história da humanidade. O Legislativo brasileiro jamais poderá aprovar lei destinada à prática de violência ou homicídio contra o seu povo. E, concluindo o estudo, nenhuma instância judiciária tem competência para autorizar o contrário ou substituir o Legislativo na sua função Constitucional exclusiva.


Por João Carlos Biagini

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João Carlos Biagini

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